Conto

Um chá com Espinosa

Fazia frio naquela tarde onde o céu era límpido e o sol não conseguia ser mais do que uma leve sensação agradável. Enquanto caminhava pelas ruas, a temperatura ia mudando, na medida em que as marquises e os prédios altos faziam sombra. Já era meio da tarde e o vento gelado parecia fazer das roupas e cachecóis uma tímida defesa.

Quando chegou na casa de chá que frequentava, surpreendentemente não encontrou fila. Era uma casa antiga, da metade do século XX, que um extremo bom gosto fez de suas salas ambientes agradáveis e muito bem decorados. De todos esses pequenos espaços, o que mais gostava tinha na parede dezenas de pequenas luminárias que, mesmo acesas, deixavam uma leve penumbra. As mesas e cadeiras misturavam estilos e até os pequenos rasgos no tecido de um sofá estilo rococó faziam parte de um charme proposital. Em outra sala, malas antigas cortadas na metade eram colocadas na parede e a sensação que tinha era que elas vomitavam o tempo. Ao fundo, jazz instrumental.

A jovem e bela atendente de olhos verdes brilhantes trouxe o cardápio em uma mão e um tablet na outra, e o lembrou de apertar um pequeno botão na mesa quando tivesse escolhido. A tecnologia combina bem com o estilo antigo do ambiente, já que esse botão acionava uma luz no relógio do garçom avisando a mesa que estava chamando.

Estava sem pressa e o próprio clima do lugar ajudava. Parecia que lá dentro o tempo nada tinha a ver com a velocidade da grande cidade, onde milhões de pessoas correm atrás da sobrevivência, em uma luta que também envolve  insegurança e  violência. Nada mais comum a todo lugar onde a riqueza e a miséria são a condição da existência uma da outra.

Na mesa ao lado, um casal de enamorados tinha seu mundo dentro daquele ambiente. Mãos dadas descansando sobre a mesa e olhos nos olhos. Um dia, esse mundo será aumentado quando descobrirem que essa perfeição foi uma imaginação, uma expectativa. Como é bom pensarmos que tem coisas que, conosco, nunca acontecerão. Tudo que outros seres humanos passaram foi só com eles e a desilusão sempre será o resultado de uma expectativa exagerada, de nos tornarmos um pouco como todo mundo.

Diferente das outras vezes, trouxe consigo o livro que estava lendo. Não foi proposital, como um ato consciente, apenas ao sair de casa levou-o junto, sem motivo. Devia ser por estar pensativo sobre o que estava lendo. Sempre gostou de filosofia, mas de uns tempos para cá, que resolveu ir mais a fundo, talvez por buscar uma nova maneira de entender a vida. Na verdade, o fato dos humanos terem consciência de um dia morrer, os obriga a que suas vidas tenham um sentido, algo que os faça ter certeza que sua passagem não foi em vão. Certa vez, o grande Saramago disse em um de seus romances que as lápides são essa última tentativa de não sermos esquecidos, quando a vida foi comum e o desejo de criança de sermos algum tipo de herói não se realizou.

Suspirou para trazer a atenção de volta ao cardápio. Escolheu um chá de frutas e especiarias. Para acompanhar, um brioche levemente doce. Depois de fazer seu pedido olhou para o livro. A capa azul era um resumo da Ética de Espinosa, comentada por seus discípulos contemporâneos.

O livro o impressionara desde o início, com a primeira de suas proposições:

“Uma única substância para todos os atributos”.

Se fosse verdade, e parecia ser se pensarmos bem, tudo que aprendera desde a infância ruíra. Recebemos uma maneira de pensar e ver o mundo e nem sequer a questionamos. Espinosa mostra com clareza o erro de Platão ao nos oferecer sua dualidade primeira; o mundo dos sentidos e o mundo das ideias ou dentro e fora da sua famosa caverna. Foi justamente por aí que as religiões criaram seus paraísos, uma ótima forma de aceitarmos pouco dessa vida e dela desviarmos atenção. Claro que Platão pensava em um Universo finito e perfeito, coisa que Espinosa, quando filosofou, já sabia não ser verdade, lá por 1650. O caos que já naquela época percebíamos no espaço era uma das faces de uma inteligência criadora que Espinosa percebeu muito além de uma ideia de como controlar as pessoas pelo medo e pela culpa.

De qualquer forma, o Deus que ele mostra seria mais factível e menos improvável do que aprendemos a imaginar. Tudo nessa imanência que vivemos é uma emanação da transcendência eterna. Morremos para que Deus possa continuar Sendo, e apenas mudamos de forma. Nossa finitude é o atestado da eternidade de Deus, na ausência de tempo. Tempo que nossa mente cria para separar o nascimento da morte.

Incrível como um homem que viveu menos de cinquenta anos, teve tamanha percepção da vida, quase sem nenhuma tecnologia.

Quando o chá foi servido, sua atenção se voltou para o bule de porcelana pintado à mão. Impossível não lembrar da casa da sua avó. A xícara seguia o conjunto e a colher pesada só podia ser de prata. Para adoçar, um pequeno pote de mel. Deixou que o aroma do chá invadisse suas narinas. Uma delícia!

“Aumento de potência”, diria Espinosa, quando algo no mundo nos dá alegria. Claro que a tristeza, seu oposto, um dia no levará a morte, mas a vida longa, como um combustível é movida por trocas que nos tragam essa alegria. A cada encontro com o mundo, com pessoas e situações afetamos e somos afetados. Sabemos que o mundo é grande demais para nós e um dia não suportaremos, mas esses encontros alegres, a mudança que se dá em cada relação com a vida é o que conta em uma contabilidade em que o bem-estar precisa estar em vantagem.

Enquanto degustava o primeiro gole, sua mente martelava: “Um só mundo, tudo uma só coisa”. Espinosa trouxe o prazer de descobrir. Para ele, a essência da mente é o conhecimento (como Aristóteles, de certa forma, também dizia). Quanto mais se conhece, mais se realiza a grande virtude, ou, como ele mesmo diz: “quando a mente contempla a si própria e sua potência de agir, alegra-se”.

Deus tem misteriosos fins, dizia o Filósofo. Queremos compreende-Lo, e isso não é possível. Vontade divina é apenas o nome que a imaginação encontra para buscar entender o que não podemos, e o medo que temos diante do incompreensível. Tudo que existe possui causa determinada e necessária para existir tal como é, e os encontros com a vida é que serão por fim, nossa liberdade de alegria ou tristeza. Tudo é esse Deus; tudo que existe. Isso inclui sua dupla expressão: o bem e mal, que nada mais são do que maneiras de entendermos e darmos um rosto para o que acontece.

Pensou o quanto isso mudaria sua maneira de viver.

Encheu novamente a xícara. Percebeu que até hoje correu atrás de desejos e o que queria, na verdade, era só entender-se. Nos relacionamentos, mais do que desejar o outro, na verdade, queria ser o desejo do outro. Ah, os desejos…

Aristóteles dizia que parar de desejar era adoecer, já para os estoicos, desejar é estar doente. Vai entender…

Espinosa caminha por outra percepção. Desejo é força criadora, energia de vir a ser outro, novo e evoluído, enfim. Não percebemos isso e transferimos para os objetos, pessoas e ideias essa responsabilidade, da mesma forma que fizemos ao médico quando não conseguimos dormir. Mais do que buscar o motivo da angústia que leva à insônia, pedimos um remédio que nos devolva o sono e mantenha a tristeza que nos afeta intacta. Espinosa sacudiria a cabeça, com desânimo.

Comeu seu brioche com o último gole de chá. Espinosa evoluiu no pensamento rebelde e complexo de Nietzsche e, a partir do final dos anos sessenta com Deleuze e sua Esquizoanálise.

Agora pode entender o motivo de Espinosa e seus seguidores estarem à margem da cultura, afinal eles nos mostram uma maneira de ver a vida que nunca imaginamos. Quase um clamor para que vivamos intensamente o que temos, sem futuro, já que o futuro nos fará diferente do que somos e seremos outro, portanto.

Enquanto pagava sua conta, pensou o que Espinosa poderia dizer-lhe depois desse encontro. Talvez ele apenas diria:

-Alegre-se pelo que tens. Que bom que podes vir nesse belo lugar e poder tomar esse chá quente em um dia frio. Mais do que pensar no que te falta, veja o que a vida te proporciona e valorize! Seus desejos serão amenizados. Sempre haverá uma insatisfação, mas o que esperar de quem tem apenas um tempo para viver? Esse espaço em aberto que chamamos desejo, é por onde nasce a criatividade, que nos empurra avante, para sermos o que ainda não somos.

Quando voltou para a rua a noite já chegara. No inverno os dias são menores e uma golfada de vento gelado crispou seu rosto. Mas por dentro estava quente, não só pelo chá, mas por ter percebido que há um mistério chamado vida para ser vivido e descoberto, até que mudemos de forma, como afirma Espinosa.

Lembrou de ligar o celular e a internet lhe avisou de mais um atentado com mortes na Europa. Resolveu não deixar a tristeza diminuir sua potência de viver. São os que matam em nome de um deus que querem empurrar goela abaixo, ou simplesmente serem heróis de alguma coisa e dar sentido a vidas medíocres.

O que virá depois?

Não importa, pois enquanto pensar nisso, a vida “agora” não é vivida. Pensou que Nietzsche lhe daria um tapa na cara se estivesse diante dele.

Seria mais que merecido!

Prosa e Verso

Prosa e Verso foi o melhor nome que o idealizador do bar pode conceber. Sua ideia foi criar uma ilha no centro da grande cidade, onde, ao adentrar a porta, o cliente mudaria de mundo. Lá fora, a agitação do trânsito, pessoas correndo atrás sabe-se lá de que? Na portaria, onde antigamente os cavalheiros deixariam seus chapéus e as damas seus casacos de pele, um pequeno armário com várias pequenas portas com chaves e um convite: “Deixe aqui seu celular e se conecte na conversa ou nos seus pensamentos”. A ideia foi bem aceita e, depois de algum tempo, levar o celular para as mesas parecia tão deselegante quanto fumar.

Mas não era só isso. A alma do lugar era a poesia e a boa música ambiente. O que se ouvia era o melhor dos clássicos, versões requintadas de sucessos e a voz das divas, grandes cantores e algumas versões arranhadas dos velhos LP’s. Mas a grande sacada era a poesia, verdadeira paixão do dono. As mesas para mais de uma pessoa eram de vidro e a cada semana era trocado o poema que ficava abaixo, como que adornando as conversas. O vidro redondo girava e todos tinham a oportunidade de ler o poema da semana. Nas mesas de dois lugares, poesias que falavam de amor e amizade. Nas de quatro e seis, os temas eram a convivência, a vida e a alegria. Mas o dono se preocupou com quem viria só, a espera de conectar consigo ou relaxar enquanto põe as ideias em ordem. As mesas de um lugar ficavam com a cadeira de costas para as outras mesas e para a circulação. Apenas um abajur, deixava o centro da mesa (essas eram de madeira), e o poema ficava na parede em frente à mesa. Uma pequena luz indireta iluminava o texto e mesmo que não quisesse, não teria como não ler. Caso a preocupação fosse grande, uma ou duas estrofes poderiam, quem sabe, trazer alguma inspiração. A ideia foi, sem dúvida, uma versão elegante dos papeizinhos com mensagens positivas que escolhemos enquanto esperamos nas salas de espera da vida.

 Um dos clientes bem-humorados disse que o bar, com suas mesas individuais, era a igreja do século XXI, onde o padre era substituído pela poesia e a bebida.

Os poemas das mesinhas de um só lugar falavam de solidão, de relacionamento findos e de momentos de mudança. Na semana passada, a mesa 6, tinha um poema de Clarice Lispector:

Quando não sei onde guardei um papel importante e a procura se revela inútil, pergunto-me: se eu fosse eu e tivesse um papel importante para guardar, que lugar escolheria? Às vezes dá certo. Mas muitas vezes fico tão pressionada pela frase “se eu fosse eu”, que a procura do papel se torna secundária, e começo a pensar. Diria melhor, sentir.

E não me sinto bem. Experimente: se você fosse você, como seria e o que faria? Logo de início se sente um constrangimento: a mentira em que nos acomodamos acabou de ser levemente locomovida do lugar onde se acomodara. No entanto já li biografias de pessoas que de repente passavam a ser elas mesmas, e mudavam inteiramente de vida. Acho que se eu fosse realmente eu, os amigos não me cumprimentariam na rua porque até minha fisionomia teria mudado. Como? Não sei.

Metade das coisas que eu faria se eu fosse eu, não posso contar. Acho, por exemplo, que por um certo motivo eu terminaria presa na cadeia. E se eu fosse eu daria tudo o que é meu, e confiaria o futuro ao futuro.

“Se eu fosse eu” parece representar o nosso maior perigo de viver, parece a entrada de novas loucuras da festa que seria, teríamos enfim a experiência do mundo. Bem sei, experimentaríamos enfim em pleno a dor do mundo. E a nossa dor, aquela que aprendemos a não sentir. Mas também seríamos por vezes tomados de um êxtase de alegria pura e legítima que mal posso adivinhar. Não, acho que já estou de algum modo adivinhando porque me senti sorrindo e também senti uma espécie de pudor que se tem diante do que é grande demais”.

Carlos foi um dos primeiros a chegar naquela quarta-feira, logo depois das 18hs, quando o “Prosa” abre. Já tinha vindo outras vezes com colegas para fazer Happy Hour, mas hoje queria ficar sozinho.
Sentia-se angustiado, a pressão do trabalho estava insuportável. A crise, tinha virado motivo de a empresa exigir cada vez mais, com a ameaça velada do desemprego assombrando cada reunião de cobrança de resultados. Já tinha virado rotina, depois de chegar em casa, ficar pensando como seria se tivesse um outro trabalho, ou como seria se pudesse trabalhar no que realmente gosta.
Em um desses dias, enquanto pensava  em voz alta, a esposa, parecendo impaciente, sentenciou:
– Tudo bem, mas afinal; o que você realmente gosta?
Não soube responder, e de lá para cá, tem procurado em si mesmo a resposta. Enquanto pensava e olhava para o “nada” o poema foi saindo da visão desfocada e a estrofe que parecia tinha sido escrita para ele, ficou como um outdoor:

“ No entanto já li biografias de pessoas que de repente passavam a ser elas mesmas, e mudavam inteiramente de vida. Acho que se eu fosse realmente eu, os amigos não me cumprimentariam na rua porque até minha fisionomia teria mudado. Como? Não sei. ”

Pensou que sua vida tinha sido, em certo sentido, uma grande mentira até agora. Se pudesse responder a pergunta que a esposa fizera, talvez já estivesse trabalhando no que gosta, usaria uma roupa diferente e, com um sorriso iluminando o pensamento seguinte, chegou a falar sozinho:
– Não sei se teria me casado com você!
Quem se casou? Quem escolheu esse trabalho? Quem pensou no nome do filho?
Como seria minha vida se eu soubesse quem era desde o começo?
Se Deus existisse mesmo, deveríamos saber o que nos faz feliz desde sempre, mas para isso precisaríamos não nos sentirmos culpados em desobedecer, em teimar contra pessoas, que, em nome de um tipo de “amor” possessivo nos indicaram o que era melhor para nós. É assim que a infelicidade passa de geração em geração, mas é aquela história: vai que no próximo mundo, na próxima vida…
Ainda era jovem de certa forma, mas ter uma família deixa a liberdade mais estreita, arriscar passa a ser conjugado no futuro do subjuntivo. A vida já não era mais dele, era o que lhe disseram quando se tornou pai.
Pediu uma caneta ao garçom, anotou a estrofe do poema, pagou a conta e saiu para ir para casa, perdido de quem nunca tinha sido até agora.

Mal a mesa tinha sido limpa, o copo de whisky recolhido que Maira chegou. Habitué dos lugares solitários, escolhia a mesa pelo poema, mas hoje o “Prosa” estava lotado e não tinha escolha. Se considerava mística e, para ela, tudo tinha uma mensagem que bastaria ter olhos para ver, segundo sua própria filosofia. Assim, o fato de só ter aquela mesa vaga, tinha como significado que o poema da parede era uma mensagem importante, uma coincidência divina.
Pediu a taça de espumante com um sorriso que esbanjava simpatia. Tirou os óculos da bolsa e suspirou buscando concentração para ler o poema. Quando viu que era de Clarice Lispector, lembrou que já tinha ouvido falar, mas nunca tinha lido nada escrito por ela. Apoiou a rosto na mão e começou a ler. Um calafrio percorreu todo seu corpo quando se deparou com a frase:

“ Metade das coisas que eu faria se eu fosse eu, não posso contar. Acho, por exemplo, que por um certo motivo eu terminaria presa na cadeia. E se eu fosse eu daria tudo o que é meu, e confiaria o futuro ao futuro. “

Era o que ela precisava ouvir!
Sua dúvida acabara de receber a “mensagem” que precisava! Iria amanhã mesmo vender o carro, pedir demissão e fazer aquela viagem de um ano para a Índia, com a qual havia sonhado meses atrás. Desde que acordou, na manhã seguinte, estava impressionada com o realismo do sonho. Passou os dias seguintes pesquisando sobre essa viagem que, tinha certeza, mudaria sua vida.
Sua amiga mais conservadora, tinha alertado que esse sonho tinha a ver com o filme que ela assistira e que ela não era a Julia Roberts,  que estaria fazendo uma loucura. Sugeriu que avaliasse com muito cuidado essa ideia de ir embora. Em um ano, tudo pode mudar. Quem garante que arrumaria emprego quando voltasse? Não daria para ter a vida a que se acostumou dando aulas de yoga, mesmo que tivesse aprendido na Índia.

A lembrança das palavras da amiga foi muito menor que a emoção. Bateu uma foto da estrofe do poema e mandou pelo Whattsapp para a amiga com a mensagem:
“Viu! Eu sabia! Olha a inspiração que recebi! ”

Pagou a conta sem sequer ter tomado um gole da bebida e saiu como se tivesse ganho na loteria. O garçom, acostumado com o que acontecia nas mesas individuais, não estranhou.
No dia seguinte, era o dia da semana de trocar todos os poemas e essa tarefa era do dono. Enquanto ele colocava os novos poemas nas mesas e na parede, o garçom mais antigo sempre pensava o que poderia mudar,  se os poemas fossem trocados nas terças ao invés das quintas.

A receita de Epicuro

Enquanto se barbeava para sair para o trabalho pensava no livro que acabara de ler. Sempre se interessara por filosofia, mas quando leu os ditos “ clássicos” tinha dificuldade de entender a linguagem rebuscada e difícil de alguns filósofos. Seus tradutores, muitas vezes, fiéis ao original não facilitavam em nada o entendimento desses caras complexos.

Um amigo, a quem confidenciava sua frustração, lhe fez uma indicação imediata:

– Cara, leia Epicuro! O que se tem são fragmentos do seu pensamento, mas é muito legal. Quem sabe se gostar poderemos morar junto um dia!

Com certeza fizera cara de assustado, já que o amigo caiu em uma sonora gargalhada e foi embora sem explicar a brincadeira, apesar dos seus pedidos. A única coisa que acrescentou foi a seguinte:

– O que os autores fazem é apenas comentar essas frases, fica bem mais fácil. Não se preocupe!

Ainda naquela semana comprou um livro sobre o tal Epicuro. Era pequeno, com poucas páginas e letras grandes, o que, à princípio, é tudo que um leitor amador busca.

Ficou surpreso com o que encontrou. O livro começava defendendo Epicuro de uma injustiça histórica; que era um hedonista, ou seja, que apenas defendia o prazer pelo prazer, como sendo o supremo bem da vida, o que ficou descartado pela leitura, mas a deixou-a ainda mais atrativa. Afinal, o que ele poderia ter sugerido para que o vissem dessa maneira?

O filósofo grego, que nasceu mais de trezentos anos antes de Cristo tinha uma maneira simples de viver e ser feliz, coisa que parece que conseguiu. Isso o fez o primeiro “cliente” da sua própria filosofia.

Toda sua tese de uma vida boa tinha apenas três únicas e singelas sugestões:

A primeira, é que a vida precisa ser examinada. Bom, isso parece fácil à primeira vista, pensou. Mas não é bem assim. Uma vida bem analisada para um filósofo parece ser uma reflexão profunda sobre seus atos, com uma lúcida compreensão do que se quer e onde chegar.

Por outro lado, isso pode ser atingido com prática. O problema é incluir esse tempo para se pensar em uma rotina tão apertada de compromissos. Lembrou que tinha feito um curso de final de semana de meditação, já fazia um ano e não tinha conseguido começar a praticar. Parece que fazer coisas para si estava na quarta ou quinta prioridade na própria vida. Talvez desde aquela época já devíamos estar ocupados, se fosse diferente, talvez Epicuro não precisasse aconselhar ninguém a fazer isso. Pode ser também que ele tenha percebido que pensamos o que nos mandam pensar. Isso tem a ver com quem nos educa ou pela mídia e religiões. Ele deve ter percebido que pensar por si mesmo exige grande esforço. Precisa pensar para pensar.

– Pelo visto, as coisas vão mal faz tempo! Disse em voz alta enquanto passava a loção pós barba e sentia aquela ardência gostosa e cheirosa.

Depois, a segunda sugestão era não ser dependente, seja da opinião dos outros ou financeiramente. Riu-se sozinho enquanto trocava a camisa. A primeira que tinha escolhido, parecia não combinar com a calça e percebeu que Epicuro o havia pego com a “boca na botija”. Acabava de mudar de ideia em relação a roupa que iria vestir, justamente para que o vissem de maneira melhor. Na hora, experimentou um certo aperto no peito. Pela sua vida inteira teve que fazer concessões para ser admirado, respeitado e sentir-se “fazendo parte”, seja de grupos de amigos, no trabalho e tudo mais.

Sussurrou enquanto amarrava os sapatos:

– Meu sonho de riqueza deve ser para poder não precisar mais me preocupar em agradar, poder fazer o que quero e não me submeter a nada e ninguém. Acho que, no fundo, todos ansiamos por isso.

Penteando o cabelo continuou a falar sozinho:

-O problema é que, quanto mais progrido, mais isso o que enriquece me amarra a compromissos e necessidade de concessões. É uma ironia mesmo essa vida. Esse Epicuro deve ter tido mesmo tempo para pensar. Também naquele tempo na Grécia ele não tinha uma fatura de cartão de crédito para pagar e nem aluguel. Bom, por outro lado, só sofrendo com a dependência, me vejo obrigado a buscar a independência como algo que me faça viver melhor.

Quando lembrou do amigo que havia indicado o livro, não pode conter uma gargalhada, afinal, a terceira recomendação para uma vida boa é estar sempre cercado de amigos. Dizia o livro, que Epicuro comprou uma casa grande e convidou seus amigos para viverem com ele. Para esse grego meio maluco, os amigos são as melhores pessoas para termos por perto, afinal elas gostam de nós sem nenhuma obrigação para isso. A vida com amigos é de alegria e companheirismo.

Parece que Epicuro imaginava o que viria pela frente, já que dizia a seus seguidores que não deveríamos nos sentir culpados por vivermos bem, afinal, isso era a verdadeira finalidade da vida. Deve ser por isso que alguém o chamou de hedonista. Incrível como viver uma boa vida aqui é errado desde aquela época. Tendemos a achar que viver mal ou sofrendo vai nos trazer vantagem em algum dia. Bobagem!

Muito antes da época do consumo, Epicuro afirmava que nada que comprássemos nos poderia fazer feliz. Um de seus discípulos, mandou fazer uma espécie de outdoor em pedra e colocou diante do mercado da cidade, onde dizia que todos deveriam comprar o necessário e que a felicidade não poderia ser comprada, a não ser seguindo os três princípios.

Quando chegou ao trabalho, passou um Whattsapp para seu amigo:

“Obrigado pela sugestão. Gostei de conhecer Epicuro, o cara é fera! Vá lá em casa hoje e vamos abrir um vinho e comemorar a amizade! Só não traga o travesseiro…”

Barolo

No centro da pequena mesa circular duas taças de vinho e dois copos com água.

Amigos a mais de trinta anos conversavam sobre quando se conheceram na primeira reunião da confraria que dura até hoje.  Dos “fundadores” alguns já não estavam mais e eram lembrados com um brinde, depois dos seus nomes serem chamados pelo presidente a cada encontro mensal. Essa era a maneira de homenagear aqueles que partiram. Foi ideia do fundador e fazia parte do regulamento dessa agradável convivência.

O que aproximou esses dois amantes do vinho foram suas preferências. Eram apaixonados por vinhos italianos e certa vez fizeram uma viagem de férias para as regiões dos mais famosos produtores da terra da “bota”. Nessa ocasião, em uma época em que nossa moeda tinha mais força, deram-se de presente uma garrafa de uma safra muito especial de um Barolo produzido em 1995. Hoje, essa garrafa teria um valor altíssimo e eles sempre adiavam o momento de abri-la, esperando uma situação ideal.

Sem um motivo aparente, o mais velho ligou e disse:

– No próximo sábado, vamos abrir. Chegou a hora!

O outro apenas concordou e ficou pensando o que teria levado o amigo, finalmente a marcar essa data esperada há anos.

Estavam silenciosos, enquanto o vinho “respirava” nas taças altas e largas. Depois de aberto, o vinho vai, à medida que o tempo passa, apresentando uma infinidade de aromas enquanto entra em contato com o oxigênio. Os amantes dos vinhos fazem disso um ritual. Antes do primeiro gole, é preciso essa reverência, de esperar que o vinho atinja seu apogeu. Vão girando a taça, vez por outra, para que esses aromas que identificam sua categoria vão se mostrando. O prazer não é só gustativo, mas olfativo. Um grande vinho é sempre uma ocasião.

O Barolo é um clássico no mundo dos vinhos, como a Ferrari, também italiana, é para os carros. O vinho estava há mais de 20 anos na garrafa esperando o momento de ser aberto e mostrar toda sua grandeza.

– Lembra quando compramos?

– Claro! Principalmente do quanto pagamos. Disse seguido de um longo suspiro.

– Se arrependeu?

– Em alguns momentos sim. Mas hoje vejo que aproveitamos uma oportunidade e podemos estar aqui e desfrutar. A vida dá voltas e quando vamos chegando nessa idade, nos damos conta que são os momentos especiais que ficam. O Piemonte é um belo lugar, aliás a Itália toda é bela. As imagens, passeios e degustações daquela viagem estão muito bem guardadas na memória. Hoje vejo que fizemos um grande investimento e estamos aqui agora para resgatá-lo.

– Não esqueça que esse é um “Riserva Speciale”, ficou cinco anos em envelhecimento antes de ser colocado à venda. Agora, passados mais de quinze anos ele está no auge, vamos aproveitar o momento!

Os minutos foram passando e o silêncio reinou entre os dois, que se deliciavam com a cor e os aromas que iam se desprendendo. Conforme o combinado quando compraram a garrafa, no dia em que fossem abri-la estariam de terno, afinal, ocasião é ocasião!

Depois de algum tempo, o anfitrião disse:

– O que você acha?

– Os aromas de ameixa seca, baunilha, alcaçuz, rosas e uma nota de chocolate. Que maravilha!

– Está perfeito! Em época de facebook, se postássemos uma foto desse vinho seríamos visitados pela Receita Federal e poderíamos ser incluídos na operação lava jato.

Riram juntos. Depois, quando pegou a taça para brindar disse emocionado:

– Vamos brindar a amizade, a alegria de estarmos confraternizando a tanto tempo!

– Verdade! O vinho nos aproximou, juntou nossas famílias e passamos bons e maus momentos. É justo que possamos brindar com esse exemplar raro. Nós sempre gostamos dos vinhos italianos e teríamos que marcar com um Barolo, apesar do Brunello merecer nosso respeito. Mas antes de bebermos, porque hoje?

– Sabe amigo, hoje temos uma idade em que, por nos cuidarmos muito mais do que quando nos conhecemos, quer significar que não podemos correr o risco de deixarmos essa garrafa de herança. Quem não sabe o que ela representa e vale, pode bem fazer um sagu com ele. Apenas senti que era hora, só isso.

Havia na voz dele um uma emoção contida. O amigo pensou ser por estarem fazendo o que esperaram por tanto tempo e preferiu não alongar as perguntas.

– Saúde, querido amigo!

– Saúde!

Depois de tomarem o primeiro gole, abriram um largo sorriso.

Enquanto os 750 mililitros eram sorvidos vagarosamente, intercalados com um pouco de água para que percebessem todas as nuances a cada gole, lembraram da viagem e da vida que se seguiu.

Como sempre, o vinho encaminha para uma conversa filosófica, sobre assuntos que, normalmente, não fazem parte do dia a dia.  O som ambiente tinha Billie Holiday, Etta James e Diana Krall que era uma cortesia ao amigo visitante e não se falou sobre política, assunto onde divergiam. Sobre isso, aliás, só tiveram uma discussão e depois de alguns anos, quando viram seus candidatos da época na mesma coligação na eleição seguinte, prometeram nunca mais falar sobre isso.

Depois da última gota, um deles perguntou:

– E agora? Esperamos isso faz tanto tempo, foi maravilhoso, exatamente o que planejamos quando compramos. Iríamos esperar que crescesse e amadurecesse com o tempo, como nossos filhos. Agora não te dá uma sensação de vazio?

Emocionado, o mais velho balbuciou:

– Dá sim.

Na hora de ir embora, um longo e emocionado abraço foi interpretado pelas esposas como efeito da alegria que só um Barolo poderia causar.

Alguns dias depois, veio a notícia que o amigo havia sido hospitalizado. Quando ligou para saber notícias, ouviu da esposa que era grave. Havia descoberto em um exame de rotina há algumas semanas e não contara para ninguém.

Agora ele tinha a resposta; a garrafa fora aberta como uma despedida e o amigo pode entender a piada, mas agora não tinha graça.

Na reunião seguinte da confraria, havia aquele silêncio que marcava a ausência definitiva de um deles.

O presidente deu início ao protocolo. As taças foram servidas e as vazias que excediam os presentes representava os que haviam partido. Os nomes eram chamados em voz alta, com a taça erguida cada um respondia:

– Saúde!

O nome do amigo foi repetido três vezes e sua taça foi colocada no centro da mesa. Aquela noite seria em sua homenagem.

Dessa vez o vinho os uniria na tristeza.

Primeira vez

 

Psicoterapia

– Então, em que posso ajuda-lo?

– Sei lá doutor, minha mulher insistiu que  precisava vir, diz que ando estranho.

– O que o está incomodando?

– Esse é o problema, não sei.

– É a primeira vez que faz terapia?

– Sim, por isso nem sei por onde começar.

– Pode começar por qualquer assunto, por exemplo, quando você me ligou para marcar esse horário estava pensando em que?

– Em nada e em tudo. Estou me sentindo totalmente perdido, mas, às vezes, irritado. Como se tivesse sido passado para trás.

– Desconfia da sua esposa?

– Não doutor! Na verdade não tem a ver com ela. Acho que meu problema é com a vida.

O terapeuta se ajeitou melhor na cadeira e pensou como esse tipo queixa é cada vez mais comum. É sempre a mesma história. Pigarreou para retomar a atenção e disse olhando por cima dos óculos:

– Como assim, com a vida? Poderia me explicar melhor? Diga exatamente o que sente, não procure palavras melhores. Estou aqui porque sou capaz de entendê-lo.

– Espero que sim. Se não der certo, nem sei o que vou fazer. Até me benzi na semana passada, tomei banho de ervas e até incenso já queimei em casa.

Suspirou longamente, pensou que precisava começar. Afinal, daqui a pouco o tempo acaba e queria sair do consultório com alguma resposta, pelo menos.

– Sempre fiz tudo certo. Quando era criança, sempre procurei ser um bom aluno para que meus pais se orgulhassem de mim. Lembro que deixei de fazer algumas coisas, brincadeiras ou travessuras que tinha vontade para não decepcioná-los. Parece que me alimentava dos elogios que recebia. Pensando hoje, parece que tinha medo que meus pais deixassem de gostar de mim. Isso é normal ou eu já era um problema desde criança?

– Mais do que você imagina, disse o terapeuta. Na verdade esse é um dos motivos que nos faz mudar sem nem termos tido tempo de sermos nós mesmos de verdade. E depois, me fale da sua adolescência.

– Bom, quando virei adolescente minha maior transgressão foi deixar o cabelo crescer um pouco e usar umas camisetas pretas. Na época não se falava em tatuagens nem brincos. Uma ou outra vez, fui ao cemitério com uns amigos na época do The Cure, lembra? O negócio era ficar triste e desencantado com a vida. Aquela coisa de gótico.

Depois de sorrir, continuou;

– Cheguei uma vez a usar uma maquiagem nos olhos, todos usavam. Mas só de imaginar a decepção que meu pai teria, limpei na hora. Sabe, nem era a surra, já que meu pai nunca me bateu, era mesmo desgostá-lo meu maior medo.

Quanto terminei o segundo grau, queria mesmo era fazer vestibular para oceanografia. Sempre adorei o mar, sabe? Quando falei disso pro meu pai, ele disse que estava surpreso com minha escolha. Que o certo era fazer vestibular para administração e cuidar dos negócios da família. Tínhamos um comércio e o sonho  dele era que eu tocasse o negócio.

– E sua mãe, disse o que? Perguntou o terapeuta.

– Disse que meu pai me amava e queria o melhor para mim. Confesso que tinha uma esperança que ela me incentivasse. Ali, percebi como ela sempre viveu a sombra do marido.

– Isso foi uma decepção para você?

– Acho que não aos dezoito anos. Pensando nisso hoje, vejo que era o que deveria esperar. Minha mãe era dona de casa, não tinha liberdade para discordar, era dependente.

– O que decidiu?

– Então, fiz o vestibular de Administração e cursei a faculdade até o final.

– Gostou?

– Não. Brincava comigo e pensava que um dia poderia ter algum negócio no fundo do mar.

Deu um sorriso amarelo, como se tivesse contado uma piada de humor negro.

– E depois?

– Conforme o script, comecei a trabalhar com meu pai e fui, aos poucos, assumindo a responsabilidade dos negócios. Ele decidiu se aposentar uns dez anos depois. Toco tudo sozinho faz quinze anos. Na verdade, não posso me queixar, me sinto até mal com esse desconforto. Mesmo não sendo o trabalho dos meus sonhos, vivo bem e pude comprar tudo que quis até hoje.

Notando que a frustração aumentava, o terapeuta resolver mudar o assunto:

– E sua vida afetiva? Teve muitas namoradas.

– Na verdade não. Como filho único, percebo hoje como eu tinha responsabilidades. Era a única chance de meus pais darem certo nessa função e tinha que atender as expectativas. Deve ser por isso que sempre fui meio quieto, na minha. Tive duas namoradas antes de conhecer minha esposa. Era a pessoa ideal para mim, lembrava muito a minha mãe em alguns aspectos.

O terapeuta sentindo o momento psicológico interviu:

– Assim você poderia “ser” seu pai?

Nunca tinha pensado por esse ângulo, e é incrível como hoje me vejo com os trejeitos dele. Será que se eu tivesse outro pai, teria me casado com outra mulher?

O terapeuta preferiu não responder, deixou que chegasse a suas próprias conclusões e pudesse, mais tarde, aprofundar a reflexão.

– Casei perto dos trinta anos,  tenho dois filhos e a mesma esposa, casa na praia, bom carro e as crianças estudam em boas escolas. Viajo para o exterior, vez por outra.

– Pelo visto sua vida é boa. Não é todo mundo que consegue o que você conseguiu.

– É boa e não é boa. Por um lado, posso dizer que tenho tudo. Por outro, parece que vivo uma história que não é minha. Na verdade, nunca quis nada disso. Nem minha esposa, que é ótima pessoa por sinal, realmente escolhi. Era só a pessoa certa com quem casar. Entende doutor?

O terapeuta não respondeu. Sustentou o olhar, dando a deixa para que continuasse.

– Quando digo que me sinto enganado é por isso. Fiz tudo que me disseram ser o certo, tudo! Só que não recebi o que esperava por ter aberto mão de um monte de coisas.

– O que você esperava? Não tem uma vida boa?

– Esperava me sentir bem, ficar feliz com o que faço, experimentar uma espécie de realização. Mas na verdade sou uma fraude, é assim que tenho me sentido ultimamente.

Depois de alguns segundos pensando, cobriu o rosto com as mãos, respirou fundo para segurar o choro.

– Não me sinto realizado, nunca vibrei com meu trabalho e tenho tido sonhos em que caio em buracos enormes, como se fossem precipícios. Minha mulher acha que devo procurar um psiquiatra e tomar uns remédios. Já não estou dormindo bem faz tempo.

– Mas você sabe o que gostaria de fazer, para se sentir melhor?

– Esse é na verdade o grande problema. Por ter fingido toda uma vida, não sei onde posso me encontrar. Tudo ao meu redor é falso, das paredes da minha casa ao saldo no banco. Nunca fui “eu” mesmo, nunca! Não quero morrer assim, desde criança nunca fui honesto comigo. De que valeu todo esse esforço? Por onde posso começar doutor?

O terapeuta não respondeu. Baixou os olhos e sentiu que havia um silêncio que precisava ser respeitado. Depois de algum tempo, fez uma pergunta:

– Que tipo de pai você é com seus filhos?

– No fundo doutor, acho que estou repetindo meu pai, dando indiretas para eles  continuarem o negócio. Ainda mais agora, depois da nossa conversa. Porque estou fazendo isso?

– Porque você está tendo com eles a mesma preocupação que seu pai teve. Esperando que essa “receita” faça com que o conforto material possa compensar o que abrimos mão.

– Vendi meus sonhos e minha identidade, não é?

– Não penso ser justo você se tratar assim, afinal, quando esse “negócio” foi feito, você não tinha condições de decidir, era uma criança ou adolescente.

– Mas não funciona, eu sou a prova disso!

– É verdade. Pense em começar sua busca  por eles.  Quem sabe, eles não têm o mapa que o leve até o lugar onde você se perdeu, onde sua identidade foi trocada, simbolicamente.

– Eu tenho cura doutor?

– O tempo acabou, infelizmente. Podemos continuar na próxima semana?

 

 

 

 

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