Osho

O TEMPO

“Bendito quem inventou o belo truque do calendário, pois o bom da segunda-feira, do dia 1º do mês e de cada ano novo é que nos dão a impressão de que a vida não continua, mas apenas recomeça…”

                                          Mário Quintana

                                                                                                                                                tempo

Já não de hoje que se fala e se pensa sobre o tempo. Com o perdão do trocadilho, faz tempo que se tenta entender o tempo e dar-lhe uma explicação. Seja para filósofos ou cientistas, quando se fala de tempo, recebemos sempre uma teoria complexa, de entendimento truncado e difícil.

O tempo e sua percepção estão ligados diretamente ao pensamento. Normalmente, trabalhamos o tempo em três dimensões diferentes: presente, passado e futuro. Porém o percebemos de forma muito individual, o que já denota sua característica eminentemente subjetiva. Isso nem é tão difícil de explicar, afinal é só lembrarmo-nos de situações agradáveis onde o tempo passa muito mais depressa do que quando estamos vivenciando momentos mais sofridos onde ele se arrasta. Uma hora de lazer nos traz a percepção de que se passaram poucos minutos, enquanto essa mesma hora em um hospital, ou enquanto esperamos uma resposta importante pode durar horas. Portanto, o tempo depende, ou como diria Einstein; é relativo.

No campo da filosofia, Platão dizia que o tempo era um movimento cíclico e assim tudo que acontecia no passado era repetido e retornava. Sua teoria encerrava o homem na sua liberdade. Penso que Platão, ao falar do tempo, estaria dizendo que sempre repetimos as mesmas coisas, só mudando o cenário (cultura, tecnologia) e concordo. Continuamos, enquanto humanidade, repetindo erros básicos, há séculos. De certa forma, metaforicamente, o tempo não andou muito mesmo. Para Platão, o tempo é um sistema de relações que tem, na história da humanidade, a função de apreender com a experiência através da memória.

Aristóteles, já mais “oriental”, afirmava que o tempo não existia. O presente não tem duração precisa, afinal “é” a cada instante, enquanto o passado já se extinguiu e o futuro ainda não é. Essa é a teoria, mais presente no pensamento budista, nos mostra que nossa relação com o passado e o futuro (que realmente não existem) só nos trazem muito sofrimento, seja pela culpa do que já aconteceu ou do medo do que poderá vir.

Para Kant, o tempo é uma estrutura da relação do sujeito com ele próprio e com o mundo, sendo uma forma a priori da sensibilidade, juntamente com o espaço. Em outras palavras, o tempo e o espaço são anteriores a qualquer percepção que temos das outras coisas. Dizia, portanto, que só podemos conhecer os objetos no espaço e no tempo.

Entendo a ideia de Kant como nossa tendência de fracionarmos a realidade, ao percebermos somente as coisas uma depois da outra. O tempo é um fenômeno da mente, que o cria para poder entender o que acontece. Como não temos a capacidade de ver tudo por inteiro, precisamos partir a realidade. Isso está muito claro em nossa cultura de “especialização”, onde tudo é entendido separadamente. Perdemos o conceito de totalidade e isso está mais claro na medicina moderna, que isola a doença de um significado, ficando restrita ao órgão atingido. A visão holística diz que não existem partes, mas um todo. O paradigma holográfico demonstra que o todo está nas partes, e não que o todo seja a soma das partes.

Já Edmund Husserl, que foi matemático e filósofo, conhecido como o fundador da fenomenologia, dizia que o tempo é uma questão de percepção de consciência, sendo definido pela forma como percebemos as coisas e não pelo relógio. Assim, podemos viver muito tempo em um momento mínimo, ou nada em um momento enorme. Essa teoria pode explicar porque nos lembramos de tão poucas coisas em nossa vida. É como se nossa memória fosse acionada quando a vida nos dá sustos, quando “acordamos”, e de depois voltamos a um estado de inconsciência, automatizado, como já escrevi em tantos outros artigos. Assim, o tempo passa de forma muito individualizada, sendo que as pessoas que se mantêm mais conscientes conseguem percebê-lo de forma mais inteira, enquanto que aqueles que vivem no “piloto automático” notam muito menos sua passagem, se apercebendo dele em datas comemorativas ou quando algo importante acontece em suas vidas. Quem já não ouviu: “Nem vi esse ano passar…”

Já Einstein provou com sua teoria que o tempo é curvo, disse em 1955 que presente, passado e futuro é uma ilusão que ainda persiste. Sua teoria permite especular a possibilidade matemática das viagens no tempo, como nos filmes de ficção. Segundo ele, apoiado pela teoria das cordas, em cada momento coexistem pelo menos dez tipos de dimensões ou realidades, cada uma, é claro, com seu tempo particular.

De uns tempos para cá, muito diretamente ligado ao modelo cultural e econômico que vivemos, começamos quase unanimemente a percebermos a passagem do tempo de forma mais rápida e isso já tem até uma explicação científica. O físico alemão W.O. Schumann constatou em 1952 que a Terra é cercada por um campo eletromagnético que se forma do solo à parte inferior da ionosfera, que se situa a 100km acima de nós. Esse campo possui uma ressonância chamada Schumann (por ter sido por ele descoberta), constante em 7,83 pulsações por segundo, como se fosse um marca passo.

Essa ressonância é coincidente com as frequências do nosso cérebro e comum a todas as formas de vida. Quando os astronautas, pelas suas viagens ao espaço, ficavam fora da ressonância Schumann adoeciam. Mas quando submetidos a um “simulador Schumann” recuperavam o equilíbrio e sua saúde. Por milhares de anos essa foi a frequência do planeta, que mantinha o equilíbrio ecológico.

Porém, a partir dos anos 80 e 90 principalmente, essas “pulsações” passaram dos normais 7,83 para 11 e até 13 hertz por segundo. Não é por coincidência que diversos desastres naturais ocorreram a partir de então, além de perturbações climáticas e atividades vulcânicas. Isso sem falar, porque tudo está ligado a tudo, também cresceram os conflitos e tensões no mundo. A conta que os cientistas fizeram é que essa mudança fez com que passássemos, devido a essa aceleração, a perceber apenas 16 das 24 horas do dia, pelo aumento da pulsação. Assim, essa ideia de que o tempo anda mais rápido já encontra abrigo nos números e gráficos.

Mas isso explicaria a mudança de nossa relação com o tempo?

No sânscrito (idioma muito antigo oriental, que tem sua origem atribuída a grandes mestres) a palavra Kal tem dois significados: tempo e morte! Para Osho, viver o tempo é viver a morte, portanto quando o tempo desaparece a morte também desaparece. Quando conseguimos “desligar” o relógio de nossa mente, o tempo desaparece e, segundo ele, experimentamos o mundo eterno, atemporal.

Quando isso acontece?

Acontece quando estamos em alegria, conectados fora dos parâmetros da mente que se baseia no medo. Nossa estrutura mental, como já disse em artigos anteriores, morrerá com o corpo e é por isso que ela sempre nos joga no futuro, nos preparando para situações ruins. Isso, é claro, tem o objetivo de, caso aconteçam, nos fazer sobreviver a elas. O problema é que, normalmente, elas nunca ocorrem e ficamos fixados no futuro, perdendo o instante raro do presente e, realmente, perdendo tempo!

Além do desequilíbrio do planeta, que reflete o desequilíbrio do ser humano que representa o “cérebro” da terra, a perda ou aceleração da percepção do tempo mostra que o problema é nosso, do jeito que vivemos. Estamos, em função dessa aceleração da vida, somente olhando para frente e não vemos que o “agora” é o que acontece ao nosso lado. Arrisco dizer que fomos nós e não a terra que se desequilibrou, já que um é reflexo do outro, porém pode ser mais fácil acharmos que essa mudança de frequência nada tem a ver conosco.

Erroneamente, os ensinamentos cristãos dizem que a “eternidade” é um tempo continuum, quando na verdade a eternidade é a ausência de tempo. Temos medo de morrer, e o tempo que cada um cria é o intervalo entre seu nascimento e morte, porque nos identificamos com a parte que perece, totalmente desconectados com nossa verdadeira natureza eterna, que se manifesta materialmente em nosso corpo.

A vida eterna não pode começar, já É, mas só para aqueles que saíram da mente que tudo divide e se conectaram com o que está atrás dela; nosso Eu que nunca nasceu e nunca morre.

A cada momento que estamos respirando conscientemente, conectados com o que estamos fazendo no exato instante, vivemos essa eternidade sem sofrimento. Quando nos perdemos na esquizofrenia de reviver o passado ou querer prever o futuro, perdemos a alegria, a eternidade e o medo chega, para nos tirar tudo, até a percepção do tempo.

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Voltamos com novos artigos em Janeiro. Espero que aproveitem esse período de descanso e vivam o tempo presente. Para quem não leu todos os textos, recomendo um passeio pelo blog e convido a deixar seus comentários. Nada termina e nada começa!

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Bibliografia:

Wikipédia
http://clicke aprenda.uol.com.br
http://leonardoboff.com/site
Osho de A a Z – ed. Sextante
Dicionário de Simbolos – ed. José Olimpio

SUFISMO

“ Falo com meu amor interior e digo: por que tanta pressa?
Sentimos que há algum tipo de espírito que ama os pássaros, os
animais e as formigas – talvez o mesmo que deu a você uma cen-
telha no útero de sua mãe.

Você acha lógico estar andando inteiramente
órfão agora? A verdade é que você mesmo se afastou e
decidiu ir sozinho para a escuridão. Agora está emaranhado em
outros e esqueceu que um dia já soube, e é por isso que tudo que
você faz tem em si algum tipo de falha.”
Kabir

sufismo

Falar sobre sufismo é falar de um caso de amor à vida, da alegria de ser e estar consciente e sem medo dessa aventura que é viver. Muitos são sufis sem necessariamente terem sido iniciados diretamente, mas porque seu jeito de sentir a existência os torna assim. Buda era um sufi, Cristo e Maomé também. Mais do que um método, o sufismo é uma maneira de viver. Apesar de ser conhecido como a corrente mística do islamismo, já existia antes de Maomé.

O Sufismo pertence ao milenar grupo de “Escolas da Tradição”, ou seja, são escolas que trabalham para desenvolver a consciência de seus membros com métodos comprovadamente eficientes, alguns milenares, outros adaptados ao que de mais moderno a ciência nos traz. Nesse ponto o Sufismo é único, pois está sempre aberto e em movimento. Em artigo anterior, já falei o sobre o Zen Budismo que, para mim, são as duas Escolas mais eficientes por serem simples e diretas em seu objetivo, cada uma a seu estilo.

O Sufismo é um mundo e não uma visão de mundo, busca a transcendência sem ser uma filosofia de transcendência. Nesse ponto é importante entender o que é “transcendência”. Aqui no ocidente significa algo que não é desse mundo, enquanto que para o oriente, logo, para o sufismo, significa algo que é além do pensamento, e isso faz toda a diferença. O que importa não é diretamente chegar a Deus, mas o caminho até Ele. Muitos sufis não falam de Deus, assim como Buda não falava, mas mostram que a “estrada” até Ele é o que realmente transforma!

Está longe de ser especulativo, porque é prático, com os pés bem fincados na terra, tendo a ação no mundo como meta. Também não é um sistema, na medida em que respeita cada membro, dando-lhe o tempo necessário para ultrapassar etapas, respeitando, portanto, a individualidade. Importante lembrar que todo um sistema busca uma explicação seja para o que venha a se propor. O Sufismo não é assim porque sabe que a explicação está dentro de cada buscador. Portanto, respeita esse Mistério que somos. Como diz Bhagwan Shree Rajneesh, “e’ como um dedo apontando para a lua, o dedo não é a lua, mas nos mostra a direção”.

Esse “método”, se assim podemos chamar, passa pelos contos, poesia, música e silêncios que acompanham os encontros e práticas pessoais. São indícios, favorecem insights, lampejos, não para tornar o “desconhecido” conhecido, porque dessa forma, estaria impondo verdades, mas para que cada um mergulhe em seu próprio Mistério. Os contos, poemas e histórias não são filosóficos, mas indicações (dedos que apontam) e que, além de uma profunda mensagem para reflexão e ensinamento, respeitam, suavemente, o momento de cada um, como uma semente que plantada corretamente escolhe a melhor hora para brotar com vigor.

Os sufis gostam de sentar, conversar e buscar o entendimento escondidos nessas estórias, de pensar livre e profundamente reunidos em um círculo, imagem mais antiga de Deus.

Aquela estória que foi tema de algum encontro, entendida naquele momento, tempos após ganha outro significado, outra profundidade. Por isso, tem por séculos, alavancado consciências e despertando buscadores.

Outras escolas (a maioria delas) têm seu foco na mente, vencê-la e transcendê-la, como o Zen, que é a Escola dos Samurais. O símbolo dos Sufis é o coração. O coração não briga com a mente, é indiferente a ela porque a entende e sabe porque ela é assim, tão mentirosa e insegura. Sua meta é a amorosidade com plena consciência, não são guerreiros, mas amantes, amigos de Deus. Sendo que esse Deus não é uma personificação, mas essa inteligência que cria e faz fluir o universo e que habita como uma centelha no interior de todos nós. O Sufismo busca desobstruir dentro de cada um essa distância e fazer florescer a centelha na sua consciência plena.

Sua pedagogia é feita de lições, histórias e poemas, que para serem apreciadas corretamente precisam de relaxamento, entrega e ausência de tensão. É como tomar um vinho especial ou um chá com um querido e antigo amigo. O caminho é o da leveza, do riso e da confiança.

Os sufis não tem crenças, afinal respeitam todas as correntes e tiram dela o que há de melhor se permitirmos descartar o que sobra, simplesmente porque são pessoas livres, já que crenças significam falta de flexibilidade, tensão e pouca tolerância. Como o caminho é o do coração, buscam a confiança. Crença é da mente, confiança é do coração, por isso que o membro de qualquer religião pode ser um Sufi, desde que esteja de coração aberto e consciência límpida de dogmas e verdades definitivas. A confiança é gentil e livre, a crença agressiva porque está presa. Quando não conseguimos confiar, precisamos de crenças para acalmar nossos medos.

O Sufismo não faz jogos mentais, é prático! Por isso além dos ensinamentos, são oferecidos exercícios que permitem mergulhos profundos no interior, práticas que,  de forma lenta e segura, levam ao autoconhecimento que é o outro nome para Deus. Em suas reuniões, partilham seus sentimentos e percepções. Com isso sempre saem enriquecidos, já que, além do entendimento próprio, ouvem o “sentir” dos demais e a cada sentimento colocado, ampliam e aprofundam o seu.

Sua ritualística é simples, mas de profundo significado. As iniciações são verdadeiros momentos de “despertar” e todo o ensinamento busca manter seus membros perceptivos, vivendo em paz e, por buscarem estar conscientes, aproveitando o que de melhor a vida oferece: o momento presente!

Quando falam de Deus, mostram maneiras de chegar a Ele. Não dizem onde fica o paraíso, mas buscam vivê-lo aqui e agora. Os sufis sabem que fugir do mundo não traz nenhuma descoberta, já que se estão nesse mundo, é para dentro dele, do jeito que ele é que buscam encontra a plenitude. Para o Sufismo qualquer livro é bom; pode ser alcorão, bíblia, Gita, Vedas, Torá etc. Por isso não são nem de longe uma religião, porque sabem onde todas erram, mas trabalham a religiosidade, na medida que sabem que Deus está tão próximo quanto nossa veia jugular. Como dito anteriormente, investigam o essencial de cada religião, filosofia e pensamento, descartando o não essencial, afinal toda essência é eterna, só o que perece é o não essencial.

As estórias sufis não pretendem buscar o status de filosóficas, portanto não existem para serem “discutas”, apenas as ouça como uma criança e vá penetrando no âmago e seu ensinamento vai se revelando. Quando Cristo disse que só as crianças encontrarão o Reino, estava se referindo a essa percepção inocente, viver com leveza em uma saudável brincadeira.

Logo abaixo, uma dessas estórias, assim como o poema de Kabir que ilustra esse texto. Uma das mais curtas e profundas que mostram que a busca é sair dos condicionamentos que nos fazem vagar pela vida sem percepção, apenas repetindo, morrendo sem nunca ter nascido para o que realmente são. Ao final de seus encontros, a despedida não é um “até logo” ou “fique bem”. É um abraço e uma lembrança: Permaneça acordado!!

-Um homem se aproximou de um sufi e perguntou:
-Como se sente?
-Como alguém que acordou pela manhã e não sabe se estará vivo à tarde. Respondeu o sufi.
– Mas isso acontece com todos! Afirmou o homem.
Ao que o sufi respondeu: – Mas quantos tem consciência disso?

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Para saber mais: “A sabedoria das Areias – discursos sobre sufismo” OSHO

O Louco e o Iluminado

“Quando você atinge a iluminação, não se torna uma nova pessoa. Na verdade, você não ganha nada, apenas perde algo: se desprende de suas correntes, de suas amarras, deixa para trás seu sofrimento e vai perdendo outras coisas. A iluminação é um processo de perda.”

OSHO

Quando nos dedicamos ao estudo dos arcanos do tarô, nos deparamos com um profundo ensinamento com a carta que começa e encerra a trajetória do homem, que vai da ignorância até a  busca da “iluminação,” que nada mais é do que um desligamento de todo o sofrimento e das alucinações sobre o passado e o futuro.  Além é claro, do total desapego, que é  não depender de nada externo a ele para se sentir bem.

Todo o mistério e ensinamento é que tanto o louco (ignorante) como o iluminado, são representados pela mesma figura. E o primeiro aprendizado é que a diferença entre esses estados opostos é ao mesmo tempo imensa e sutil.

Tanto um quanto outro estão fora da “curva” de normalidade, e isso é muito interessante, afinal os dois são considerados pela psicologia e psiquiatria como pessoas com alguma patologia. Existe o que se chama de “normal”, que nada mais é do que pessoas diferentes entre si – lembrando que ninguém é igual a ninguém – que tem comportamentos semelhantes, sonhos semelhantes e acham que o certo e o errado é o mesmo para todos. Evidentemente que isso é que é doentio, em minha opinião.

Dessa forma, podemos encontrar dois tipos de loucos, a saber: o primeiro tipo são aqueles que estão abaixo da linha da normalidade, são pessoas realmente doentes devido a distúrbios, enfermidades psicológicas de vários tipos. Esse tipo de loucura é involuntária, já que ninguém escolheu isso para si. Precisa de cuidado e tratamento!

Do outro lado, temos os loucos acima da linha da normalidade, que são pessoas que não temem o desconhecido, não tem medo do ridículo (o que os outros vão pensar), sabem que o “conhecido” as mantêm estagnadas e vão em busca de seus sonhos sem medo. Essa loucura é voluntária e representa a minoria, aqueles que estão realmente vivos e em evolução. São eles que, na verdade, podem até perder tudo, menos a razão!

E é, justamente por isso, que os dois tipos de loucos representam ao mesmo tempo a ignorância e a sabedoria. O louco sábio tem consciência de sua ignorância, por isso busca seus sonhos sem julgar o dos outros, não busca convencer ninguém de suas ideias e, principalmente, está ligado ao que acontece a cada momento, sem se preocupar muito com o futuro, que ele sabe ser mais uma das alucinações dos preocupados “normais”.

Tanto o iluminado como o completo ignorante andam pela vida de forma inocente, quase infantil, parecendo irresponsáveis sobre seus atos, afinal eles não premeditam nada e não esperam nada dos demais. Certa vez li um trabalho que mostrava que os psicóticos (pessoas desligadas da realidade para a psiquiatria) tem uma expectativa de vida maior do que as pessoas ditas normais, afinal eles não se preocupam com nada, se expressam livremente sem repressão, não guardando mágoas nem rancor, muito menos se estressando com a vida. Deve ser por isso que são fortemente medicados e mantidos sob confinamento. Nesse mundo normal, realmente, não há lugar para gente assim!

A consciência é estar inteiro a cada momento e essa é a única felicidade! Tudo que acontece fora de mim, como os problemas do cotidiano, as perdas e tristezas agem sobre cada pessoa diferentemente. Aquele que está inconsciente fica reativo às situações e é governado por elas e seu sofrimento é longo e penoso. Já quando alguma coisa abate uma pessoa consciente, ela tem uma autonomia de, livremente, dar outro sentido ou significado ao que aconteceu e nunca é dominada pela situação.

Por mais simples que possa parecer, lembre que se estamos conscientes nada nos acontece fora do nosso controle. Quando alguém, por exemplo, está comendo demais, usando álcool, drogas  ou qualquer outra forma de atitude contra si mesmo (auto sabotagem), isso só ocorre pela inconsciência de não entender a raiz do seu sofrimento passando a buscar compensações externas.

Agora fica mais fácil de entender que quando estamos lúcidos e congruentes (comprometido com o que sou hoje), estamos experimentando uma espécie de unidade, já quando perco minha percepção da realidade por estar vivendo as alucinações do passado e do futuro estou na dualidade, que, como sabemos, é a raiz do sofrimento humano. Fico dividido em dois: meu corpo e vida aqui, meu pensamento o tempo todo fora do tempo presente, negativando situações e criando um estresse baseado em nada que seja real, apenas em expectativas delirantes.

Osho disse certa vez em uma de suas palestras, que, quando nos aproximamos de Deus temos uma sensação de estarmos ficando loucos, e isso me parece simples de entender. Se vivemos no mundo da dualidade desde quando nascemos, tudo que conhecemos, portanto normal, é dual e sofrido. A evolução tende a nos levar a unidade e ao fim do sofrimento e isso parece mesmo loucura, não acha?

Justamente por isso o caminho evolutivo é sempre uma trajetória solitária, que poucos se dispõem a empreender, afinal,  normalidade cobra um preço caro para quem sai do bando, se arvorando na loucura de ser diferente!

Então, se pensarmos bem, veremos como é profundo o significado dessa mesma carta representar dois extremos, ao mesmo tempo, tão parecidos. Quando alguém lhe disser que essa ou aquela pessoa é louca, procure prestar atenção, fique atento, e cuidado com os julgamentos rápidos, você pode estar diante de um Mestre!

O Louco - Tarô de Marselha

E agora?

“Se você está realmente saudável e não sabe o que fazer agora, a vida perde todo o sentido. Quando uma sociedade é pobre ela é feliz, quando enriquece torna-se triste.”

Osho – O cipreste no jardim

Você já ouviu falar da angústia sem por quê?

Como psicoterapeuta já ouvi falar muitas vezes quando do meu primeiro encontro com muitos clientes. A história é mais ou menos essa, com poucas variações:

“Na verdade, não sei exatamente porque estou procurando uma terapia… Não tenho um motivo específico, nada de complicado está acontecendo. Tenho um bom emprego (ou sou meu próprio chefe), tenho família, filhos, um bom carro, casa própria. Mas sinto uma certa angústia, um vazio, uma tristeza sem motivo…”

Recebemos desde que nos tornamos mais ou menos conscientes, uma espécie de roteiro de felicidade que vem pelo meio cultural, família e, é claro, pela mídia do que é necessário para sermos “felizes” ou sermos reconhecidos como pessoas bem-sucedidas e respeitadas. O que vimos acima é esse roteiro e o que acontece é que quando atingimos as metas estipuladas ficamos esperando que essa “felicidade” chegue, junto com a tranquilidade e a segurança de nos sentirmos fora de perigo.

A questão fundamental é justamente que essa felicidade não está relacionada diretamente a atingirmos as metas materiais ou sociais, mas a vivenciarmos nossos talentos de alguma forma. Enquanto estamos na busca desses objetivos tudo vai bem, afinal estou imaginando que quando cruzar a linha de chegada estará esperando por mim tudo que me foi prometido. Só que, para aqueles que chegam (e isso está acontecendo cada vez mais cedo), onde está a recompensa?

Evidentemente que o conforto material é bom, nos proporciona oportunidades e tudo mais, mas então qual a razão de pessoas abastadas economicamente se sentirem angustiadas?

A resposta é que elas não estão vivendo suas “vocações”, aquele talento com que todos nascemos e que, quando colocado em prática, mesmo como um passatempo, nos preenche e faz todo o resto (que não traz tanta alegria assim) ser encarado com naturalidade. Nenhuma pessoa nasceu sem um dom especial, e é essa vivência que trará o que nos disseram que viria quando cumpríssemos a lista de bens e ações exigidas pelo status quo. O ser humano, como parte integrante da natureza, precisa estar sempre em evolução, buscando algo, tendo um objetivo a atingir, se realizando de alguma forma. Assim como podemos observar em qualquer fruto, quando termina o crescimento, imediatamente chega a morte…

Só os animais ditos irracionais é que vivem apenas para “sobreviver”, para nós, humanos, espera-se mais!

Muitas vezes, fico me perguntando se esse número crescente de doenças autoimunes, ou seja, produzidas pelo nosso próprio organismo, não seriam um sinal de que não estamos fazendo o que deveríamos fazer? Não há nada de errado em cumprirmos esse script, mas se ele não está nos preenchendo, nos realizando, porque não abrirmos espaço, iniciando nossa busca a fim de descobrirmos em que somos realmente bons?

Lembre que não precisa ser nada de espetacular, de grandioso ou inédito. Precisa apenas fazer sentir-se bem! Desde qualquer atividade artística, manual, esportiva ou mesmo solidária, mas que faça você perder a noção do tempo enquanto pratica.

Quanto mais conforto obtemos, mais focamos nossa força em querer mais esperando que o momento da tranquilidade chegue no próximo carro, na reforma, no título que melhorará nosso currículo, etc.

Desista, não é isso!

Não é tão difícil encontrarmos pessoas realmente felizes, mas independente de sua posição financeira, o que elas têm em comum é essa vivência, esse sentir-se “inteiro”, em paz consigo justamente por estarem sendo e vivendo, mesmo que em períodos curtos, sua verdadeira natureza. Imagine então quem faz do seu talento seu trabalho? Essas pessoas realizam suas atividades com alegria e o sucesso financeiro é sempre uma consequência. São pessoas realmente ricas, já que estão felizes com o que possuem, mesmo querendo avançar financeiramente (que é normal), não fazem disso a razão de sua atividade.

Portanto, se você, caro leitor (a) está nessa corrida, proponho um pit stop para refletir se seu trabalho ou estudo está lhe levando a essa realização, ou a ser mais uma vítima do “conto da felicidade” que continua levando alguns a terem crises, ficarem doentes, depressivos, angustiados, comendo e bebendo em excesso, etc.

Caso se descubra seguindo nesse roteiro, que não terá um final feliz, pense no que gostaria de fazer, seja como trabalho ou divertimento, que traga alegria e uma realização pessoal (nessa hora, por favor, não se preocupe com que os outros vão pensar) e traga um tempero agradável a sua vida!

Quantas pessoas conhecemos que passaram por crises agudas, doenças graves e que depois desse evento mudaram completamente suas vidas e hoje estão plenamente adequadas e alegres? Elas entenderam a mensagem da doença e fizeram as correções de rumo necessárias. Outras não tiveram a mesma sorte e fica a questão se não é essa a diferença entre os que se curam e os que perecem?

Não espere que seu corpo mande um doloroso aviso de infelicidade; traga alegria, divertimento e faça o que lhe faz bem!

Paradigmas

 

O Homem não é feliz sem algum delírio. Delírios são tão necessários quanto a realidade.

Christian Nestell Bovene

Como você aprendeu a ser quem é?

Aprendemos a ser quem somos de acordo com a cultura em que estamos inseridos. Copiamos um modelo de viver daquelas pessoas que são nossas referências, principalmente na nossa primeira infância. Nessa fase, não temos como separar o “joio do trigo” e assimilamos integralmente nossos pais, professores, valores religiosos, etc. Evidente que esse processo segue pela vida afora, mas a assimilação de novos paradigmas* tem um processo um pouco diferente, onde já existe uma consciência crítica, uma espécie de filtro.

Como qualquer animal (também somos), aprendemos tudo por um simples sistema de punição e recompensa. Assim quando fazíamos “certo” vinham os elogios, o acolhimento e nos sentíamos bem. Já quando fazíamos “errado” vinha a punição, o medo de perdermos os elogios e o afeto de nossos heróis. Evidentemente, pelo medo das perdas que os comportamentos “errados” traziam e, sequiosos pelos elogios, buscamos agradar e esconder qualquer atitude, pensamento ou comportamento que gerasse punição.

Nessa hora, é importante entender que não escolhemos em que acreditar, e todos os significados que atribuímos às situações vem de segunda mão. Isso se deposita em nós de tal forma que criamos nosso programa de pensar, ver e entender cada situação que a vida nos oferece. Assim, conforme o artigo sobre a culpa, agora complementado pelo presente texto, surge nosso “juiz” interior.

O medo de sermos rejeitados, de perdermos o carinho e acolhimento, de não sermos “bons”, nos faz buscar uma perfeição, criando recalques e escondendo parte de nós mesmos em um lado escuro, que se não bem entendido e trabalhado, nos perseguirá pela vida, surgindo nos momentos em que não consigo mantê-lo escondido e controlado. É o que acontece quando “perdemos a cabeça”, ali vem o egoísmo, a ira, a inveja e todos os pecados capitais que nada mais são do que esse nosso lado escuro, comum aos seres humanos e que os paradigmas religiosos, principalmente, transformam em pecado.

Pelo programa que recebemos de “certo e errado,” goela abaixo, vivemos sempre pela metade, fazendo muita força para sermos bonzinhos e adoráveis. E é justamente por isso que a maioria das religiões prega o não-julgamento, afinal fico julgando pessoas que estão expondo aquilo que consigo manter escondido. É evidente que se conseguirmos nos manter longe dos pecados será bom, já que tendo a não expor a mim e aos outros a alguns sofrimentos, o que não impede de serem revistos, se servem ou não.

Parece que todos nós precisamos dos paradigmas, e até aí nada de errado, ter uma linha a seguir não é ruim, mas o que penso ser importante é pensarmos sobre esses paradigmas, se eu concordo com eles, se não concordo, se posso me libertar de algum caso não esteja me fazendo bem ou impedindo meu crescimento pessoal. Essa avaliação é que me  faz dono de minha vida. Caso contrário, passarei pela vida como uma pálida cópia de gerações anteriores.

Nessa hora recorremos a nossa imaginação, criando situações utópicas para termos uma vivência mais completa dessa nossa dualidade, onde, muitas vezes, nos permitirmos ser inteiros. Nesses delírios tudo nos é permitido, até viver livremente essa parte reprimida. Mas isso é tão errado pelo programa, que muitas vezes nem compartilhamos com pessoas íntimas sobre eles, já que temos medo do que elas pensarão sobre nós. Em muitas ocasiões, esse conteúdo vem nos sonhos, quando o que vivenciamos é tão impossível ou errado que nem nos permitimos divagar de olhos abertos.

Como em nossa cultura a liberdade está diretamente relacionada ao poder financeiro, a busca da riqueza, muitas vezes está inconscientemente ligada a atingir um patamar de liberdade que me permita ser mais “eu” mesmo. Assim encontramos os ditadores que se tornam cruéis quando atingem o poder, empresários que se permitem tratar seus empregados com desrespeito e ofensas, pais violentos e as pessoas que, depois de atingirem certo grau de poder, se transformam completamente.

Evidente que é normal querermos ser aceitos, mas é importante estarmos de comum acordo com nós mesmos. Posso escolher ser educado, ético e respeitoso com os limites de cada pessoa, mas isso dá muito mais certo quando parte de uma escolha interna, de uma decisão e não de imposição. Penso que devemos educar nossos filhos por valores que acreditamos corretos, mas também respeitarmos suas escolhas com o objetivo de valorizar a individualidade e não de suprimi-la. Fazê-los escolher é mais difícil do que, simplesmente, não darmos escolhas, que é o que ocorre normalmente. Usamos a nós mesmos como parâmetro para educarmos, como se eles fossem uma continuação. Não são! Talvez seja por isso que os domesticamos da mesma forma que fomos para garantir que serão parecidos conosco. Osho disse certa vez que educar é fazer transbordar a essência e que crianças não precisam de nossa ajuda, mas só de serem amadas. Sua idéia é que o que chamamos de educação (isso também inclui a escola) nada mais é do que impor os paradigmas, assim como fizeram conosco. Talvez ele seja entendido nesse ponto daqui a duzentos anos…

Tomara que estejamos felizes, de bem conosco e com a vida, se não estaremos impondo a eles um programa que não deu certo nem para nós.

Os significados que recebemos também nos dizem do que somos e não somos capazes (nada mais limitante), do que devemos almejar, como deve ser nossa vida, e o que é a felicidade. Mas como uma das características do paradigma é não discuti-lo, simplesmente executá-lo, ficamos dizendo que todos que não cumprem meu paradigma estão errados.

No fim, estamos sempre buscando a nós mesmos em meio a essa luta interna entre o que sou, e o que esperam de mim, como diria Fernando Pessoa. Por isso os delírios são, muitas vezes, necessários. Não se culpe por eles e também não se sinta mal, se esse mundo criado pela sua imaginação não estiver de acordo com o que você vive pelos paradigmas que recebeu. Afinal, já que  não escolhemos quase nada, porque não delirar?  Não lembro onde li ou quem disse que nossa imaginação é apenas uma realidade que se esqueceu de acontecer…

 

*Paradigma: Paradigma pode ser entendido por um exemplo, um modelo, uma referência, uma diretriz, um parâmetro, um rumo, uma estrutura, ou até mesmo ideal. Algo digno de ser seguido. Podemos dizer que um paradigma é a percepção geral e comum – não necessariamente a melhor – de se ver determinada coisa, seja um objeto, seja um fenômeno, seja um conjunto de idéias. Ao mesmo tempo, ao ser aceito, um paradigma serve como critério de verdade e de validação e reconhecimento nos meios onde é adotado. Foi o físico Thomas Khun que o utilizou como um termo científico em seu livro A Estrutura das Revoluções Científicas, publicado em 1962.  (http://www.artigonal.com/ciencia-artigos/o-que-e-paradigma-705722.html)

Leitura Complementar: O quinto compromisso – Don Miguel Ruiz

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