Amor e Ódio

“É como um pêndulo de um relógio. O pêndulo vai até a esquerda, a extrema esquerda, então, para a extrema direita… Aparentemente ele parece estar indo para a esquerda, mas ele está gerando impulso para ir para a direita.

Assim é na sua vida. Quando você ama uma pessoa, você está gerando impulso para odiar a pessoa. Eis porque a pessoa a quem você ama e a  que você odeia não são duas pessoas diferentes”.

                                       Osho – Teologia mística

 

“Nascemos com necessidades, essas necessidades nunca serão inteiramente supridas, mas amamos nada mais que nossas necessidades.

 As necessidades quase sempre aparecem inexplicavelmente ligadas à raiva, em geral dirigidas a alguém que as evoca sem satisfazê-las plenamente”.

                                          Laura Knipis – Contra o Amor

                                                                                                                                                                                                                amor e ódio

Como pode o amor se transformar em ódio?

Na verdade, tudo que é uno se manifesta de forma dual, amor e ódio são as duas maneiras de expressar uma mesma coisa. Como alguém que amamos (ou pensamos isso) pode ser alguém que nos  gere ódio, raiva ou decepção algum tempo depois?

Muitos estudiosos da psicologia defendem a tese que estamos nos projetando todo o tempo na outra pessoa. Como padecemos da falta de autoconhecimento, o que vemos a todo instante no outro nada mais é do que  nós mesmos. É como se  a outra pessoa fosse um espelho onde me vejo o tempo todo. Como a função  do espelho é apenas refletir uma imagem, oscilamos tão bruscamente de sentimento ao nos vermos por vários ângulos.

Podemos até arriscar dizer que o que chamamos de “gostar” ou “amar” nada mais  são que as nossas próprias qualidades que estamos recebendo de volta desse espelho chamado relacionamento. E aqui não falo somente dos relacionamentos afetivos, mas entre amigos, pais e filhos e tudo mais.

Quando, porém, vemos no outro aquilo que não gostamos em nós, que afeta a imagem que temos de nós mesmos, o sentimento se transforma em ódio e no momento em que isso acontece parece que estamos diante de outra pessoa. A identificação é tão profunda que o “espelho” reflete uma imagem distorcida e, em momentos assim, dizemos até que a pessoa em questão estava transfigurada.

Como que alguém que conhecemos há anos (e, às vezes, são muitos anos) pode nos surpreender? Como pode acontecer de ficarmos chocados depois de tanto tempo?

A resposta só pode ser uma: realmente não conhecíamos a pessoa, pensávamos isso. A surpresa de ver o outro tão diferente advém de, na verdade, nunca termos realmente “visto”  como ela realmente é. Víamos a nós mesmo o tempo todo e não percebíamos.

Quando estudamos o fenômeno da “Sombra” fica mais fácil de entendermos esse processo. Segundo esse conceito, só podemos ver no outro aquilo que somos ou poderemos ser.

Observo na prática clínica com frequência essa mudança brusca de quadro quando estamos trabalhando com a terapia de casais. É comum a frase: “Nunca pude imaginar que ele(a) poderia agir assim. Depois de tantos anos…”

Toda a expectativa que desenvolvemos em relação a outras pessoas sempre tem uma base, que sou eu mesmo. Expectativa significa esperar que a outra pessoa aja como eu em determinada situação. Dessa forma, estou novamente diante do espelho esperando do outro a minha ação. Assim, não fica difícil entender como as decepções são algo que certamente ocorrerão e só o que muda é o tempo que isso vai levar.

É muito difícil não agir assim, exigiria um tamanho conhecimento de si que não está disponível para a maioria dos mortais. Torna-se necessário um tamanho conhecimento do conteúdo reprimido que carregamos desde a formação do nosso Ego que precisa uma busca de, quem sabe, uma vida inteira.

Assim, o que podemos fazer para evitarmos tudo isso?

Penso que o primeiro passo é tomar consciência de como as coisas são. Uma boa autoanálise já ajuda. Para tanto,  basta respondermos seriamente algumas perguntas:

– O que admiro na pessoa?

– O que me irrita nela?

– Em que momento tenho vontade de uma aproximação?

– Quando prefiro estar a quilômetros de distância?

Procurar ver o outro  (e lembre que isso vale para todos os tipos de relacionamento), como alguém realmente novo, que não conheço e quero verdadeiramente descobrir. Claro que essa busca pode trazer boas e más notícias, mas veja por  outro lado; é bem melhor a verdade que a ilusão.

Pode ser um dia, oxalá, possamos nos responsabilizar pelo nosso gostar ou não gostar de alguém, por aquilo que o outro realmente é ao invés do que esperamos que a pessoa seja.

Caso contrário vamos de relacionamento em relacionamento nos encontrando e desencontrado de nós mesmos, sem termos tido a oportunidade de realmente conhecermos aquela pessoa que cruzou em nosso caminho, voluntária ou involuntariamente, como no caso da família.

Quando os orientais dizem que vivemos uma grande ilusão o tempo todo (maya), é lícito pensarmos que tem a ver com isso também, ou seja, nos iludimos vendo a nós mesmos quando deveríamos ver o outro. Ficamos projetando nossos sonhos internos o tempo todo para fora, criando uma realidade particular vista apenas pelos olhos de quem somos.

Justamente por isso a frase; “jamais poderia imaginar…” tem um profundo significado. A situação não pode ser imaginada justamente por isso, não faz parte da minha realidade interior. Vez por outra a vida nos assusta, tirando-nos do sonho da imaginação do dia a dia quando constatamos que alguma coisa não foi como imaginávamos ou pensávamos.

Portanto, tanto o amor como o ódio é uma só coisa; aquilo que as pessoas que estão o tempo todo me mostrando; quem sou, minhas qualidades e meus defeitos.

Para muitos místicos essa nossa identidade além do ego é um imenso vazio. Para o Zen, isso é chamado de “ninguém”. Enquanto acharmos e nos identificarmos com esse alguém que pensamos ser, chamado de Ego, também pensamos que não somos a nossa Sombra e vamos vivendo na escuridão, compartilhando a vida com pessoas que imaginamos ser algo, de  quem gostamos ou não.

Isso, no final, é uma grande injustiça.

Quem sabe, só no pensamento, quando nos perguntarem que somos, nosso nome ou coisa parecida, respondêssemos:

– Sou ninguém.

Dessa forma, poderemos ir, aos poucos, abrindo nossos olhos internos para nosso Ser inteiro, única maneira de podermos realmente ver quem está na nossa frente.

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