A TERAPIA

“Veio Darwin e nos ligou a um macaco; depois veio Pavlov e nos ligou a um cão; e, depois veio Freud e nos ligou a um falo. E, como os três mosqueteiros eram, na verdade quatro, quero dizer-lhes que, pelo menos um por cento do homem é Deus…”

Oriol Anguera

“Ser normal é a meta dos fracassados.”

Carl. G. Jung

terapia

A psicologia que hoje conhecemos é bastante recente, apesar de o ato terapêutico, enquanto escuta ou psicoterapia, ser tão antigo quanto a existência do homem. Na verdade, a psicologia propriamente dita originou-se da filosofia e eram os filósofos, através de seus questionamentos sobre a verdade, a alma, o universo e tudo que envolve esse mistério que é viver, que primeiro exerceram essa função de psicoterapeutas. Mas, imagino, que desde os tempos mais remotos, quando alguém em angústia se colocava ao lado de outra pessoa, que em silêncio, porque ainda não haviam as palavras, apenas fazia companhia com interesse ou solidariedade, a terapia já existia.

Na medida em que o tempo foi passando, o que hoje entendemos por psicologia, sempre esteve a serviço da cultura dominante em cada época, dando o veredito sobre a sanidade ou a loucura de uma pessoa. Hoje, em sua variação tecnológica, a psiquiatria dispõe de medicamentos cada vez mais poderosos para ajudar a pessoa a manter-se “nos trilhos” ou voltar para eles, sem prejuízo de sua capacidade produtiva, que, no mundo em que vivemos, é o que realmente importa e move todo o sistema de saúde.

O ser humano sempre padeceu de uma enfermidade primária que é a falta de autoconhecimento, já que sem esse saber essencial, as pessoas tornam-se facilmente manipuláveis e perdem sua liberdade. Assim, o que temos visto ao longo do tempo é a psicologia moderna estabelecer limites de normalidade para seres humanos que não tem ideia de quem sejam, ou seja, muito abaixo de suas possibilidades evolutivas. Salvo exceções como os transpessoalistas, Carl Jung e outros que acreditavam que a normalidade é viver a diferença que todos temos, todas as demais formas de psicologia procuram colocar pessoas, que são diferentes entre si, em um “molde” e ajustá-las a ele, sem sequer perceber que isso é a maior violência e insanidade que se possa cometer.

Já escrevi em tantos outros textos, em aulas, palestras e conversas que todas as pessoas que fizeram alguma diferença na história da humanidade eram consideradas loucas em suas épocas. Todos eles pagaram um preço por se recusarem a usar os “óculos” padronizados das massas e decidiram ver a realidade e a interpretarem por sua própria ótica. Apesar de todas as dificuldades, percalços e sofrimento que passaram essas pessoas, elas realmente viveram seu tempo lucidamente, enquanto todos os demais vagaram como zumbis pela sua existência sem nem sequer perceber que estavam realmente vivos.

Por isso que não estranho que em laboratórios de psicologia se façam experimentos com animais. Pavlov nos mostrou como somos condicionáveis com seus cachorros e os símios e ratos ainda são utilizados para que se possa entender como os seres humanos agem. Isso é bem mais do que uma piada de mau gosto. Mas, talvez, você que me lê, possa perguntar:

Mas esses testes realmente funcionam isso está mais do que provado!

Sim, é verdade, mas somente porque uma pessoa completamente inconsciente de si mesma e de seu potencial não difere em nada de um animal irracional, ou seja, que não usa seu potencial humano (superior). Os cachorros, macacos e ratos representam esse ser humano adormecido, condicionável, que vive baseado no medo. Tem dúvida sobre isso? Veja e pesquise sobre a venda de ansiolíticos e antidepressivos em nosso mundo globalizado, moderno e desenvolvido…

A verdadeira psicologia deveria trabalhar sobre o quanto uma pessoa pode se desenvolver e não procurar adaptá-la e acomodá-la a parâmetros de um mundo doente como esse que vivemos. Esse jeito de viver que conhecemos como “normal” é assim: violentam crianças, desrespeitam-se e agridem-se idosos, torna as pessoas compulsivamente consumistas, avalia uma pessoa pelos bens que ela agrega a sua identidade, privatiza a riqueza, globaliza a miséria, sexualiza o pensamento desde a infância e obriga as pessoas a se mutilarem com o intuito de vencer a passagem do tempo e outras tantas, realmente, loucuras.

Portanto cuidado; se você não for assim e não concordar com isso, logo estará se sentindo meio solitário e fora de contexto e precisará de uma “boa” terapia para se engajar novamente e sentir-se acolhido pelos demais.

Trabalhar o potencial de cada um é investir no que torna cada ser humano único. Se fossemos todos iguais, como prega a psicologia da acomodação, todos os DNA’s seriam idênticos. Muitos estudiosos e visionários da verdadeira medicina de almas sempre viram as crises, que hoje chamamos de doenças, como um grito do cachorro, macaco ou do rato que simbolizam essa perda de si mesmo, de querer tornar-se realmente humano! Mas o que se faz? Anestesia-se, acomoda-se, para aceitarmos de bom grado uma vida medíocre, uma angústia suportável pelos bens que compramos e que vão perdendo razão e utilidade cada vez mais rapidamente.

Os sofrimentos psíquicos e, logo adiante corporais, dão-se pelo conflito de quem realmente somos e aquilo que se espera que sejamos. Quando um ser humano coloca em ordem a ecologia do seu Ser, então o equilíbrio ou a cura pode acontecer e isso deveria ser todo o enfoque terapêutico, mas isso só se dá com a vivência de nossa individualidade.

Como nos ensinam os antigos terapeutas do deserto, da época de Jesus, quando nos curamos o universo também se cura. Dessa forma, podemos sim, pensar que a doença do planeta, da sua cultura, é a doença do ser humano, justamente por ela afastá-lo de sua essência.

Vivemos em um mundo que leva a existência muito a sério, tornamo-nos fanáticos pelo que transitório, abandonando nossa verdadeira identidade, aquilo que realmente somos, que nunca nos foi permitido  viver e descobrir, se não estiver dentro do que se considera “normal”.

O ser humano é a mistura da natureza com a aventura, como bem afirma  Jean Yves Leloup. A aventura é a nossa liberdade de interpretar o que nos acontece, dar um sentido novo ao que se passa conosco, à nossa existência, a possibilidade de mudar de vida e de buscar novos desejos e conhecer novas estradas. O terapeuta deveria, porque não, tornar-se um hermeneuta, e sua prática deveria envolver a arte da (re)interpretação, de  ver as situações com outros significados.

Penso que a maior função do terapeuta, talvez não seja a de explicar, mas de estimular a capacidade da pessoa de produzir um novo sentido para aquilo que lhe acontece. A verdadeira psicologia deveria se fundamentar no que cada um tem de mais saudável, mas o que vemos é estruturar-se sobre o aspecto doente e, a partir dai iniciar o que se chama de tratamento.

Nosso limite evolutivo precisa ser parametrizado “por cima”; porque não um Sidarta, Jesus, Sócrates, Mansoor, etc.? Esses até hoje ainda seriam considerados insanos, apesar de milhões se dizerem seus seguidores. Infelizmente o parâmetro do que se espera de uma pessoa é não ser ninguém de especial!

              Há quem diga que um louco perdeu tudo, menos a razão…

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Para saber mais: “Cuidar do Ser” Jean Yves Leloup – ed Vozes

                          Os Mutantes – Pierre Weil – ed Versus

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