Meditação

“Penso noventa e nove vezes e nada descubro; deixo de pensar, mergulho em profundo silêncio – e eis que a verdade se me revela.”

                                                 Albert Einstein

“Existem atitudes do homem que o leva ao amadurecimento, uma delas é a meditação.”

                                           Tailini Girardi

                                                                                                                                                                                                                 MEDITAÇÃO

Tem sido cada vez mais comum nos últimos anos a procura pela meditação como uma solução para problemas como a ansiedade, depressão ou com o objetivo de buscar mais equilíbrio diante dos, cada vez maiores, desafios da vida moderna. O problema é uma grande expectativa (e toda a expectativa de hoje é a frustração certa de amanhã) de que, em poucos dias, uma grande mudança acontecerá. Como meditar é mudar e isso leva tempo, faz com que não haja a persistência necessária para que os resultados apareçam.

Falar em meditação é saber que existem muitas definições, técnicas variadas e toda ordem de misticismos envolvidos o que sempre pode atrapalhar.  Meditar é algo simples, mas alguns pontos precisam ser entendidos.

Para os leitores de “Céu e Inferno”, lembro que  meditar é buscar sair do inferno da mente e buscar o céu da consciência eterna e isenta de sofrimento. Lembre que o conceito de eternidade  é da ausência de tempo, ou seja, não há passado nem futuro, origem de todas as angústias e preocupações.

Então, para começar, o processo da meditação pede que durante a prática, renunciemos a tudo que for exterior, com o objetivo de criar a condição de interiorização, para isso, fechar os olhos é necessário. Vivemos e fomos criados pensando que somos aquilo que temos e queremos ter. Não é fácil se perceber sem “nada”, mas nunca esqueça que sofremos sempre pelo que dizemos que “temos” ou chamamos de “meu”, incluindo tudo que imaginamos que, quando tivermos, seremos mais felizes. A meditação, com o tempo, mostrará que você é um saudável “ninguém”, que na verdade não é dono de nada nem de outras pessoas. Com isso o fardo fica leve e a alegria ganha espaço!

Mostra a natureza nas suas leis simples e verdadeiras que não há progresso sem empenho e esse estado de se perceber livre, nem que seja pelos poucos minutos de prática, leva algum tempo e saber esperar é sabedoria. Queremos tudo para já, e para isso temos dinheiro, cheque, cartão de crédito, débito e imprimimos boletos. Mas estados evoluídos são conquistados e não comprados.

Como bem dizem os budistas, o objetivo da meditação é simplesmente o silêncio sublime, a tranquilidade e a clareza mental, mas como conseguir isso com a mente trazendo lembranças e preocupações sobre o futuro a todo o momento? A resposta é a renúncia a tudo que somos e temos, conforme descrevi acima.

Sidarta Gautama disse certa vez que: “Um meditador, cuja mente se incline para a renúncia, com facilidade alcança o Samadhi* (objetivo final da meditação)”. Mas isso não é você doar suas coisas, terminar seus relacionamentos e amizades e viver na pobreza. É apenas, durante os minutos de meditação se desvencilhar disso tudo, para voltar a sua origem de “ser”. Manter o domínio da mente evitando os pensamentos sobre família, trabalho, compromissos, responsabilidades e, principalmente, as previsões escabrosas sobre o futuro. Para aqueles que gostam de lembrar das situações ruins que já passaram, também evitar afundar na lembrança e sofrer de novo. Imagine, apenas imagine, que você é alguém desprovido de história como ensina Ajaan Brahmavamso.

Para isso, existem alguns recursos, cabe experimentar para descobrir com o que mais se adapta:

– Utilizar uma frase ou palavra (a isso chamamos “mantra”) e ficar conscientemente repetindo essa frase/palavra com o objetivo de manter a mente presa, sem que ela possa “fugir” para os assuntos que citei acima.

– Manter-se conscientemente focado na sua respiração, observando atentamente a entrada e saída do ar.

– Visualizar alguma situação ou imaginar-se em local agradável e evitar “sair” desse lugar.

– Visualizar alguma imagem fixa, que pode ser um símbolo de seu agrado ou qualquer outro (a isso chamamos de Yantra), mantendo a atenção fixa nessa imagem.

Existem infinidades de outras técnicas, e nada impede que você crie a sua, lembrando que o importante é manter a mente “presa” em algo. Obviamente que isso não será conseguido com facilidade, mas a persistência traz o resultado. Cada vez que se perceber divagando entre passado e futuro, simplesmente retorne sem brigar consigo mesmo e retome o processo. Milhares de vezes isso acontecerá. Como você já foi avisado, não dê importância, é assim mesmo.

Procure manter sempre a coluna ereta e para isso pode usar uma cadeira onde apoiar as costas. Ficar sentado em posição de lótus é uma imagem clássica de meditação mas está longe de ser obrigatória. Caso Sidarta e outros que atingiram o máximo onde um ser humano pode chegar morassem em um lugar frio, garanto que sentado no chão não daria certo. Muitos procuram copiar a posição e outras coisas achando que isso os levará ao mesmo lugar. Bobagem!

Quem chegou “lá”, foi com anos de prática e de colocar sua vida dentro de uma perspectiva menos sofrida e isso só aprendendo a estar fora da mente para conseguir.

Manter a coluna ereta ajuda com alguma tensão a ficar atento. Perceber que a cabeça inclinou para baixo ou que as costas curvaram é um sinal de que precisa retomar a atenção na meditação.

O fato de um determinado dia a meditação ser gratificante, de experienciar uma calma profunda e paz interior, não quer dizer absolutamente que isso é algo conquistado e que sempre será assim. No dia seguinte pode ser tudo difícil e frustrante, e isso faz parte. Não existem garantias, é a prática pela prática, sem expectativas. Faça porque é bom, reconhecidamente traz resultados, mas não espere nada.

Esse é o ponto, não é um negócio ou uma troca. Não existe ninguém nesse ou de outro mundo para recompensá-lo. Portanto, não é alguma negociação, como muitos fazem com as religiões esperando que nada vá acontecer com eles nem com os seus entes queridos por fazer parte dessa ou daquela crença e, quando acontece algo ruim, trocam de papa, ministro ou pastor.

Esse desapego dos resultados é decisivo, mas a mente é essencialmente dúvida e  medo, logo ela nunca vai ajudá-lo. Aliás, vencê-la é a meta. A mente nunca vai parar, o que acontecerá é descobrir que esses pensamentos não são seus, enquanto consciência, mas das necessidades do corpo e do medo do sofrimento e da morte.

Com o tempo, poderá acontecer de perceber-se cada vez mais fora dos processos da mente, se tornando um “observador” dos conteúdos que ela traz. Obviamente, quem observa só pode fazê-lo por estar do lado de fora e estar assim é não sofrer.

A meditação também pode ser ativa, ou seja, fazendo algo. Pode ser correndo, nadando ou até mesmo fazendo alguma atividade criativa. Como saber que esteve meditando? A resposta é: se perdeu a noção do tempo e não ter pensado em mais nada além da atividade em si. Esse é o tipo de meditação que as pessoas mais fazem, sem saber que estavam em meditação e é tão válida quando a outra, com uma diferença importante: a atividade evitou as distrações da mente enquanto a passiva ou sentada é uma busca de dominá-la e entende-la.

Depois da sua prática, volte a fazer suas coisas e pensar no futuro é uma delas, mas vá procurando evitar viver nele. Uma das possibilidades é que irá acontecer o que imaginamos, mas pode ser tudo diferente e quase sempre é. Perguntado sobre isso certa vez Sidarta respondeu: “O que quer que vocês pensem que assim vai ser, sempre será algo distinto. O sábio compreende que o futuro é incerto, desconhecido e portanto imprevisível”.  Deixe sempre aberta a possibilidade de que o melhor aconteça, porque para a mente serão apenas tragédias e sofrimentos.

Inicie com dez a quinze minutos, no máximo, por dia por uns seis meses. Aumente o tempo quando se sentir confortável, e não fique anunciando ou divulgando o quanto você medita. Já vi até “selfie” de pessoas meditando. Isso é puro ego e infantilidade. Pessoas assim podem dizer que ficam horas em meditação, mas provavelmente ainda não saíram do lugar. A auto compreensão vai pela via contrária da exposição.

Quanto mais você for se aprofundando, imagino que as fotos, palavras, angústia e medos irão diminuindo em troca de clareza e mais silêncio interior.

Por isso, meditar é perder o desnecessário e ganhar o imprescindível.

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*Samadhi – é a unidade com o Espírito, é o estado mais elevado que se alcança pela meditação prolongada e profunda. Consiste em dissolver a bolha do ego no oceano do espírito. É o estado onde não existe distinção entre o “eu” e o “objeto”, experimenta-se a unicidade com o Todo.

Para saber mais: O método básico de meditação. Ajaan Brahmavamso – ed. Orbi